Sudão: Formação de «Governo técnico»

Sudão: Formação de «Governo técnico»

26/11/2021

Manifestantes em Cartum, Sudão. Milhares de pessoas saíram às ruas nas principais do Sudão para exigir que o poder seja entregue a um governo exclusivamente civil e que os líderes golpistas sejam responsabilizados (Foto: Lusa)

Há um mês os militares derrubaram o governo interino do Sudão e prenderam os líderes civis do Conselho Transitório Soberano nascido em Agosto de 2019, após a chamada «Primavera sudanesa». Semanas depois, no passado dia 21 de Novembro, o primeiro-ministro Abdulla Hamdok, que até ao dia anterior se encontrava em prisão domiciliária, foi libertado e anunciou um acordo com o General Abdel Fattah al-Burhan – chefe do exército e líder dos golpistas – para formar um «governo técnico».

Abre-se, assim, uma nova etapa, que devolve a esperança do restabelecimento do caminho da transição democrática que teve início em 2019 quando, sem derramamento de sangue, a «revolução sudanesa» – em grande parte levada a cabo por mulheres e jovens – pôs fim ao regime de Omar al-Bashir. O ditador, que chegou ao poder em 1989 e que permaneceu no poder no Sudão durante 30 anos, tornou imediatamente claras para o mundo as suas intenções autocráticas e desrespeitadoras dos direitos humanos.

O acordo entre Abdallah Hamdok e o General Al Burhan revê o plano de partilha de poder e as linhas mestras da transição democrática, favorecendo os militares, e, por isso, as principais organizações civis, sindicais e políticas opõem-se-lhe em bloco. Entretanto, milhares de pessoas saíram às ruas a manifestarem-se contra o acordo, exigindo que o poder seja entregue a um governo exclusivamente civil e que os líderes golpistas sejam responsabilizados.

«Estamos confiantes de que este é realmente um novo começo. Devemos agradecer à comunidade internacional por apoiar o governo civil, os manifestantes sudaneses e todos aqueles que trabalharam para que o primeiro-ministro pudesse ser reintegrado. Este é um novo compromisso entre os militares e Hamdok, que concordaram em regressar ao leme do executivo, de modo a não desfazer o que foi alcançado nos dois anos anteriores, pondo fim à violência e ao derramamento de sangue que se tem verificado desde o golpe de 25 de Outubro», disse D. Yunan Tombe Trille, Bispo de El Obeid e Presidente da Conferência Episcopal do Sudão e Sul do Sudão, no dia seguinte ao anúncio de um novo pacto assinado entre civis e militares.

O bispo observa: «Hamodk irá criar um novo executivo técnico que deverá conduzir o país pacificamente até às eleições de 2023. Durante semanas, a junta militar tem estado sob pressão da comunidade internacional para libertar e reintegrar Hamdok como primeiro-ministro. Entretanto, mais de quarenta civis, todos eles manifestantes, foram mortos pelas forças de segurança num mês de governo militar».

«O povo – conclui D. Yunan Tombe Trille – está dividido. Alguns não querem qualquer tipo de acordo com os militares, que se retiraram apenas devido à pressão da comunidade internacional e nem sequer expressaram palavras de arrependimento pela morte de inocentes; outros não querem dar ao primeiro-ministro tempo para trabalhar em paz e trazer o país para o rebanho da comunidade internacional. Existe agora apenas um primeiro acordo. Os militares conservaram todos os privilégios e poder que tinham durante a ditadura anterior e é pouco provável que os abandonem para facilitar uma transição democrática. A experiência mostra que muitos acordos foram assinados no passado apenas para serem quebrados pelos militares. A esperança é que a nação possa recomeçar em paz e democracia».

Com informação da Agência Fides